Pobres Criaturas, filme de Oscar – resenha

Salve, salve, seres humanos da terra.
Hoje não era dia de resenha, mas vi filme de Oscar, então tenho que resenhar logo para pegar o hype. Sim, é isso mesmo. Então vamos nessa com um texto enorme sobre o filme do momento: Pobres Criaturas.

Esse filme é complexo, então vou dividir o post em duas partes. Na primeira vou dar um geralzão e na segunda vou comentar os detalhes com Spoiler. E pode deixar que aviso quando o spoiler começa.

Pobres Criaturas:

Pobres Criaturas

Pobres Criaturas (Poor Things) é um filme de Yorgos Lanthimos e está concorrendo ao Oscar em 11 categorias.

O filme conta a história de Bella Baxter (Emma Stone), uma mulher criada por um cientista louco. Uma mulher morta grávida, o cientista doideira (Willem Dafoe) pega o corpo, coloca o cérebro do bebê no corpo da mãe e reanima o corpo. Ou seja, ela é uma mulher adulta com um cérebro de bebê, em desenvolvimento. Você deve estar pensando que isso é antiético e bizarro e talvez você deve estar pensando em Frankenstein. E é por aí mesmo. Guarda essa ideia.

Willem Dafoe, um cara bizarro, que sofreu vários experimentos por parte do próprio pai, é um cientista malucão, mas também é professor de medicina e arruma um aluninho (Ramy Youssef) para ser seu assistente. O aluno começa a se relacionar com a Bella, que aos poucos descobre sua própria sexualidade. Ele cogita se casar com ela e é então que entra em cena o advogado (Mark Ruffalo), que já fica interessado na bela, porém inocente, Bella Baxter.

O dotô adevogado, advogado convence Bella a conhecer o mundo com ele e eles saem viajando pelo mundo. Então Bella começa sua jornada de descoberta, tanto da própria sexualidade, quanto das verdades e crueldades (mais ou menos) do mundo. E acho que aqui é até onde eu posso ir sem spoilers.

Ela sai para viajar e suas descobertas a mudam, mudando sua relação com o advogado, mas especialmente com o mundo à sua volta.

Bella:

Bella é tem um cérebro de criança, criada por um cientista. Ela ama testar, descobrir e quase não tem inibições. Essa é a chave de sua vivência e exploração, tanto social quanto sexual. O fator sexual é muito importante. E é até onde eu posso falar sem entrar nos spoilers. (Não vi trailer, então não sei até onde o trailer já revela)

Um detalhe importante. Tem muito sexo no filme, então escolha bem com quem você vai assistir

De resto o que eu posso dizer é que é um filmaço. Assista. Recomendo demais! E depois volte aqui para ler a análise melhorzinha com spoilers. Ou, se você não liga para spoilers, vem comigo que eu te conto tudo.

Agora tem SPOILER!

Conforme Bella conhece mais pessoas, filosofia, as dores reais do mundo, ela se desprende do advogado, que até então era seu mentor nesse novo mundo e no mundo do sexo também. Isso a deixa sem dinheiro em Paris, o que a leva a trabalhar como prostituta em um bordel, o que é excelente para ela, que precisa de dinheiro e quer novas experiências sexuais.

Quando o Willem Dafoe fica doente, ela volta para casa e o confronta sobre seu passado. Ela aceita casar com o aluno, mas então aparece o marido da mulher morta que viria a ser Bella Baxter. Ela, enquanto cientista, quer descobrir sobre o passado e aceita ir para a casa desse marido original (eu não lembro o nome de ninguém). Rola um conflito, porque ele quer controlar e prender ela, mas ela se safa relativamente rápido e volta para casa.

E fica tudo bem. Fim do filme.

Pobres Criaturas

O que eu achei de Pobres Criaturas?

Esse filme é uma doideira. Eu demorei para entender sobre o que ele era, mas felizmente assisti com uma pessoinha maravilhosa e a gente ficou conversando depois. Daí eu finalmente achei a minha chave de interpretação.

A referência do cientista louco criando vida e se achando Deus (a Bella até chama ele de God), me parece uma referência óbvia a Frankenstein. Além disso o filme começa em preto e branco, com o Willem Dafoe todo cheio de cicatrizes, contando casos horrendos de sua infância enquanto é rodeado de animais mutantes. O que você esperaria? Tragédia. A mais pura e bela tragédia.

Daí a Bella aceita viajar com um cara que adora o fato dela ser gostosa com mente de criança. O que eu espero? Tragédia. Então ela começa a trabalhar num bordel e a tragédia não vem.

Enquanto eu assistia (antes de poder parar para refletir) eu fiquei com a sensação de que o filme era leve demais. Esperei horror, depressão e morte, mas nada disso veio. E mesmo assim era uma história bem contada, mas tinha alguma coisa que eu não estava captando. Algo que só vai fazer sentido no final do filme.

O segredo (na minha interpretação, ok?) é que esse filme é uma grande enganação. Ele é o que eu resolvi chamar de Anti-Trágico.

A Anti-Trágica pós-vida de Bella Baxter:

Pobres Criaturas

Esse filme me parece (minha opinião! Se discordar comenta aqui, vou adorar conversar com você) ser o Frankenstein reverso.

Em Frankesntein, o monstro é criado pelo cientista virtuoso, que se corrompe. Ele cede aos impulsos da ciência maluca, cria o monstro e se arrepende depois. O monstro nasce sofrendo rancor e desprezo e apesar de ser incrivelmente capaz (ele é super forte, super rápido, super inteligente), ele não se encaixa em nenhum lugar porque ele é um monstro. E é feio. Frankenstein é uma grande tragédia. O filho rejeitado só busca vingança, enquanto o criador rejeita e quer destruir a própria criação.

Em Pobres Criaturas: por mais estranho e bizarro que o cientista seja, ele cria a sua criatura. Talvez justamente por não ser virtuoso e não ter ética (e o cientista é monstruoso nesse caso), ele abraça e cria a sua criatura de perto. Por mais que ele se diga frio e sem sentimentalismos, vemos que ele tem afeto por ela depois que ela vai embora.

Ciência:

Todo o resto, se decorre por conta dessa criação. Ela não foi criada em um mundo de moralidade (cristã?) e sua criação é de uma cientista. Eu sempre digo que crianças são pequenos cientistas e ela vive testando coisas enquanto tem sua mente ainda jovem. E como ela nunca é impedida, seu ímpeto de descobridora, segue com ela por toda a vida, culminando em ela mesmo fazendo uma experiência no fim do filme.

Algumas reações que me pareceram estranhas (como ela tratar com muita normalidade as relações sexuais no bordel), me parecem reflexos dessa não-moralidade. Ela quer entender o sexo e está disposta a experimentar, até com espécimes que não a agradam. A gente não precisa gostar de todos os testes, certo?

Mas tudo isso que eu falei até agora, ainda não resolve o problema. Como assim, uma garota bonita, com cérebro infantil viaja pelo mundo sem sofrer nenhum abuso? Esse é o meu pensamento pessimista, alimentado por elementos de tragédia. E aí o filme me engana lindamente.

O mundo antes e o mundo depois:

Já na reta final, Bella vai viver com o homem que foi o marido dela antes de sua morte. E é o único momento em que ela corre perigo real durante todo o filme. Esse homem normal, banal, mundano, a ameaça de mutilação genital, de cortar fora seus desejos. Ele é um marido que entende a mulher como posse e que está disposto a feri-la e a prendê-la. Exatamente o que meu eu pessimista espera num filme.

E no final mesmo, ela se livra dele e vai viver uma vida feliz e plena com sua família estranha com gente esquisita. Na casa do cientista louco, fazendo experiências malucas, com seus dois amantes, uma afilhada fruto de um experimento maluco, animais mutantes e um humano com cérebro de bode. E, pasme se quiser, isso é um final feliz. Pobres Criaturas!

O segredo a meu ver, é que a vida de Bella Baxter, pode ser dividida em dois momentos. Antes e depois de sua morte/renascimento. Antes é o mundo normal de uma mulher de sua época. E depois ela vive nesse mundo de ficção científica onde coisas como ética e moral são apenas detalhes.

E então me parece que depois de sua morte, nesse mundo bizarro, ela teve liberdade e afeto como nunca antes. Então, como eu disse, nessa vida empoderada (ela simplesmente passa por cima de tudo por ser “amoral”), ela quase não passa por perigos reais (é fantasioso, mas entrega a mensagem). Ela só vai passar por perigo real quando se encontra com a vida antiga, no “mundo normal”. Esses poucos minutos no mundo normal, trazem todas, as desgraças e tragédias que eu espero da grande tragédia que é a vida real.

A ficção é mais estranha que a realidade, mas pode ser melhor:

Então o filme bate na minha cara e diz “Olha, isso aqui é ficção. E aqui as coisas podem ser boas, por mais estranhas que pareçam. Aceite isso.”. E ela termina feliz com sua família bizarra. Enquanto as Pobres Criaturas terminam de assistir ao filme e voltam para suas tragédias muito normais.

As Pobres Criaturas sãs aquelas que vivem no mundo real.

Pobre Criatura sou eu, que não consigo sentar numa sala de cinema sem esperar estupros, abusos e horrores inomináveis.

E é isso que eu penso sobre esse filme.

Comentários Gerais:

Pobres Criaturas

Além da mensagem maluca e confusa. Eu preciso comentar que o filme é uma obra de arte incrível do ponto de vista de direção e arte. Os figurinos são deslumbrantes. As paisagens são fantástica. Até as nuvens do céu são bonitas. A trilha sonora é bem esquisitona e reflete a esquisitice do filme. Os cenários são bonitos e o ritmo da narrativa é muito boa também. Além disso o filme tem umas câmeras estranhíssimas e encurvadas, com uns ângulos doidos. Tudo, absolutamente tudo, é pensado para causar estranheza e ser lindo ao mesmo tempo. Dá pra ganhar vários oscars sim.

Os atores estão demais no filme também. Emma Stone e Willem Dafoe estão demais. O Mark Rufallo está muito bem também, mas eu não gosto do personagem.

Apesar de conhecer o sexo com muita gente, me parece que ela só teve sexo com afeto de verdade quando foi com uma mulher, que acaba vivendo com ela no final.

Algumas coisas eu não gostei, será?:

Tem uma cena onde ela descobre o que é a pobreza. Eu entendi a ideia e para que ela serve, mas achei meio corrida e uma mal acabada. Um dos poucos momentos que eu me desliguei do filme.

Dá para criticar o filme dizendo que ele é um grande clichê de Born Sexy Yesterday, já que muito da graça (nos dois sentidos da palavra) é o fato dela ser linda, porém inocente. Mas me parece que a graça é justamente quebrar isso. Porque eu pensei isso… e como eu já expliquei, eu só espero o pior.

Eu tenho um pouco de ressalvas sobre a questão sexual (tenho que refletir mais à respeito). Eu entendi a mensagem (eu acho), mas pode passar a mensagem errada, especialmente para homens que se fazem de burros (ou são burros mesmo). “O que eu faço não assédio ou abuso, as mulheres que são travadas demais sobre sexo. Se elas fossem descoladas como a Bella o mundo ia ser mais legal. Exceto as mulheres da minha família, e claro.”. Mas também não sei se quem faz uma obra tem que ficar se preocupando com as interpretações erradas sobre ela. Posso pensar mais nisso em outro momento.

Concluindo:

E chega. Se tenho mais coisa para falar, eu já nem lembro mais. Esse post está enorme e eu estou cansado.

Então é isso. Filmaço. Esteticamente lindo e engana genialmente com sua narrativa anti-trágica. Se não assistiu, assista, se assistiu, assiste de novo e volta aqui para comentar o que você percebeu.

Recomendo demais mesmo!

Pobres Criaturas

Então é isso. Pobres Criaturas que leram esse textão todo. Mas eu tinha muita coisa para falar.
E você, o que acha? Tem coisa para falar?
Vamos discutir aqui na área de comentários.
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Um abraço.
E tchau.

Vulto

Desprezível.

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4 Resultados

  1. Carla disse:

    Muito tocada pela crítica. Vários detalhes que realmente mexeram comigo. E ainda estou sentindo o filme.

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