Deus Ex Machina – Homem Animal #26, o final (parte 14)

Salve, salve, seres humanos da terra.
Finalmente chegamos ao fim dessa mega saga em 14 partes! Já fazem meses que eu venho resenhando essa grande saga que é a fase do Homem Animal escrita pelo Grant Morrison. Então vamos lá para o momento que todos (poucos, mas todos ainda assim) esperam, o grande final: Deus Ex Machina.

Relembrando:

O Homem Animal era um personagem série B dos anos 60. Ninguém se lembrava dele, tanto que ele chegou a fazer parte dos Heróis Esquecidos. Então veio a Crise nas Infinitas Terras, apagando infinitos universos e compilando tudo em um só. Vários personagens foram remodelados e repensados e então o Morrison pega para escrever o Homem Animal e o transformar em alguma outra coisa (mais ou menos como o Alan Moore fez com o Monstro do Pântano).

Essa fase começa como uma minissérie de 4 edições para falar sobre direitos dos animais, mas logo se mostra bem diferente, porque o vilão não é um vilão. Daí, a partir da edição 5, O Evangelho do Coiote, a coisa começa a ganhar características de metalinguagem. Alguns personagens sabem que são personagens de quadrinhos e tudo vira uma piração com os Aliens Amarelos representando os editores e as mudanças que precisaram ser feitas para reencaixar a cronologia do novo universo único, recuperando os frangalhos despedaçados do multiverso.

Daí vira loucura e temos o Homem Animal como o único personagem que nós acompanhamos ser rebootado; trazido para os tempos modernos, onde tudo é sério e dark (a esposa e filhos são mortos). Então ele se vinga, continua vingativo, viaja no tempo e volta para o arco final.

No arco final os personagens pré-crise tentam voltar a partir do Pirata Psíquico, o Homem Animal chega para ajudar e sai dos quadros mais uma vez. Depois disso ele vai para o limbo dos quadrinhos onde passa por uma jornada antes de abrir uma porta com uma chave de papel e encontrar Grant Morrison, o cara que escreve suas histórias. E é aqui que estamos.

Deus Ex Machina – Homem Animal 26

Homem Animal 26 Deus Ex Machina capa

A história começa mostrando o quarto do Morrison e logo ele e o Homem Animal entram. O Morrison explica aquilo que já sabemos, mas talvez o Homem Animal não entendeu ainda, ele é o escritor, a mente maligna por trás de toda a desgraça na vida de de Buddy Baker. Ele mostra isso apontando para um monitor que descreve a cena dele apontando para a tela do monitor. Morrison diz que pode escrever o que ele quiser que o Homem Animal faça.

Buddy fica puto, pega o Morrison e joga pela janela. O roteirista reaparece e diz que ele mesmo quem planejou isso. “Você não é do tipo violento”.

Deus Ex Machina

Então ele começa a explicar que ele faz parte de uma história em quadrinhos, mostra os gibis para eles e conta que também escreve A Patrulha do Destino. Também revela que, quando ele está com a Liga da Justiça Europa, é outra pessoa quem o escreve. Eles saem para dar uma volta. Nessa parte eles passam por locais que já apareceram na história em um sonho do Highwater.

Então eles conversam bastante (não descrever tudo em ordem) e falam de várias paradas que envolvem a metalinguagem que essa história representa. Morrison conta que matou a família do Buddy porque “Mortes sem sentido dão ‘realismo'” e que não pode trazer eles de volta porque não seria realista.

Eles brigam, o Homem Animal diz que o Morrison nem é um escritor bom, mas a história segue com o roteirista explicando a dinâmica do mundo para a sua criatura.

Luta e Agradecimentos:

Em dado momento, ele fala que a história está muito tediosa, com muito papo, e diz que é hora da luta. Então o Morrison cria dois vilões temáticos genéricos para enfrentar o Homem Animal. Enquanto a luta ocorre no plano de fundo, o autor, em forma de personagem, decide fazer agradecimentos à equipe que fez os quadrinhos, os desenhistas, a editora Karen Berger e mais algumas pessoas.

Quando o Homem Animal está quase morrendo, tudo some e ele está curado. É só uma história em quadrinhos. O Homem Animal fica puto (mais uma vez) e diz:

“NÃO É UMA HISTORINHA, É A MINHA VIDA!
MINHA VIDA SEU DESGRAÇADO…”

O Morrison fala mais um pouco e, depois de uma reflexão sobre realismo, decide “ter um pouco de bondade”. Então ele mesmo some, assim como o cenário, deixando apenas o herói em um quadro em branco. Então ele reaparece em casa. Logo depois ele encontra sua família de volta. Todos vivos. E assim acaba a história do Homem Animal, com o herói chorando de alegria por ter recuperado algo.

Epílogo:

Como epílogo temos 3 páginas com o Grant Morrison encerrando a história. Ele reconta que, quando criança teve uma amiga imaginária chamada Posinha. O autor, agora personagem, se comunicava com ela através de uma lanterna. Ele pisca a lanterna e sai, mas no último quadro, uma luz se acende e Posinha, a raposa responde.

E fim.

O que eu achei de Deus Ex Machina?

Essa á a última chance que eu vou ter de falar sobre essa série como um todo. Vai ser difícil, porque tem muita coisa, mas vou tentar amarrar tudo o que precisa ser amarrado.

Muito se critica o Morrison por ele não saber escrever finais e eu entendo a crítica, apesar de ter ressalvas. A sensação que eu tenho é que o Morrison é, antes de um escritor, um fã. Ele gosta da bizarrice, gosta dos personagens antigos e bizarros (ele vai trazer o Capitão Cenoura como um personagem sério em Multiversity) e toda essa meta história que existe por trás das histórias em quadrinhos. Editores mudando de ideia, mudanças de regras editoriais, reboots, reorganizações, multiversos e tudo isso. É só ver o que ele fez com o Batman, recolocando maluquices como o Batman de Zur-En-Arrh de volta na cronologia. Dito isso, me parece óbvio que ele não consiga terminar as histórias, já que ele sempre quer deixar coisas abertas para que alguém use no futuro (como Sete Soldados da Vitória, que serviu de prequel para Crise Final, 3 anos depois).

O legal é que o próprio Morrison afirma, nessa história, que ele não sabe terminar histórias, porque a própria vida dele é uma bagunça.

Voltando para o Homem Animal:

Eu venho dizendo desde o segundo post dessa série que toda essa fase do Homem Animal é uma crítica e uma rebelião de um homem só contra o processo de “adultização” dos quadrinhos. Para o Morrison essa ideia de que os personagens precisam ser “realistas”, sérios, trágicos e moralmente duvidosos é uma enorme bobagem. Caso não tenha ficado claro, ele deixa isso claro em dois momentos: Quando ele diz que o Homem Animal não é do tipo violento, “com uma arma em cada bolso e excesso de testosterona” e naquele momento perto do fim, onde a história se resolve:

Deus Ex Machina

Essa discussão é muito clara durante toda a história, em alguns momentos de forma mais clara (quando o Homem Animal usa o uniforme preto e vira um vingador assassino; e o próprio Overman), mas também em detalhes sutis (quando seu inimigo deixa de ser o Mestre dos Espelhos para ser um cara sem graça, de terno e do qual ninguém se lembra; por exemplo).

Sobre a forma, a forma como o Morrison conta a história é muito interessante. Porque, querendo ou não, essa é a última história de um arco e, sim, nós esperamos um pouco de ação. Daí ele usa uma artimanha legal que é colocar a ação lá, mesmo que seja apenas para zombar dela. Mas tem ação.

Além disso, a coisa de ver o autor, como um personagem, agradecendo aos desenhistas e à editora, é muito lúdico. Pode parecer idiota para alguns, mas a ideia é que essa coisa lúdica, essa piração que só os quadrinhos permitem é muito melhor do que muitas batalhas cósmicas e épicas por aí (eu também gosto de batalhas cósmicas, mas não todas).

A volta da inocência?

Pode passar despercebido (e eu quase esqueci de falar), mas o epílogo tem toda uma simbologia. Quando o Morrison decide ser bom e deixa o Homem Animal ter um final feliz, ele mesmo, enquanto personagem/autor, se permite viver em um mundo melhor. E é por isso, que a história não termina com o Homem Animal, ela termina com o próprio Morrison vivendo em um mundo melhor, onde a Posinha responde.

Ele diz “Posinha, Eu voltei”. Esse “Eu”, é ele criança, a melhor versão dele, a que acredita em amigos imaginários e o que acredita que os Heróis podem ser bons. Ele voltou.

Homem Animal 26 Deus Ex Machina

Concluindo Deus Ex Machina:

Essa fase é fantástica como eu já venho dizendo em todos os posts. Ela é fantástica por ser incrível em sua metalinguagem, por pegar um personagem qualquer e transformar em um ícone da weird fiction nos quadrinhos.

É muito importante por ser a primeira (provavelmente, não tenho certeza) hq a falar de reboot como um elemento dentro da história.E ainda mais importante porque através dessa história o Morrison falou “então galera, e se a gente não jogar o multiverso fora? Vou guardar ele aqui com o Pirata Psíquico para caso alguém queira usar depois.”. Felizmente o Multiverso volta em Crise Infinita e segue firme até hoje.

Mas, a principal função é ir contra a adultização que vinha bombando na era Image e na era onde todo mundo tentava fazer seu Watchmen (ou Cavaleiro das Trevas, ou Piada Mortal), mas tudo virava horror, tragédia, morte e personagens armados atirando com trabucos.

Deus Ex Machina

E chega! Essa série é foda e se eu não consegui fazer você ler até agora, eu desisto! Você tem que ler (ou reler) essa fase sensacional!

E ACABOU! NEM ACREDITO.

Se quiser comprar, você encontra por aí, mas se for rico, compre pela Amazon.


Então é isso, a série mais longa da história desse site. Estou exausto, mas passo bem. Adorei fazer porque o gibi é bom.
E você, já leu Deus Ex Machina? Ficou convencido a ler?
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Um abraço.
E tchau.

Vulto

Desprezível.

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2 Resultados

  1. Pensador Louco disse:

    Acho que nunca poderei te agradecer o suficiente por ter feito essa série de resenhas, e como bom velho que sou vou largar uma história longa aqui:

    Li essa saga a primeira vez no início dos 90, começando a vida adulta e muito ligado em dorgas, filosofia e demais atrocidades sociais. Comecei a lê-la despretensiosamente, achava bem escrita, gostava dos temas de ecoterrorismo mas, fora essa última série de temas engajados, a via como uma história em quadrinhos bem escrita, e nada mais.

    Já havia lido Watchmen, Dark Knight Returns, Sandman, não era minha primeira incursão nos quadrinhos “mais adultos” vindos do Reino Unido. Mas foi esta que me elevou de longe além, me fez ver quadrinhos, e a vida à qual estes se atrelam (e por vezes refletem, quando não ocorre o contrário), de uma maneira melhor. Ora porra, Homem Animal era entretenimento puro, infanto-juvenil-adulto, tudo ao mesmo tempo agora sem fazer concessões a um ou outro especificamente, mas mesclando tudo num fluxo caótico de histórias que, tais como a ordem implicada (muito referenciada lá) em si, só se encaixavam quando vocẽ se afastava pra olhar o quadro inteiro.

    Mais ainda, a conclusão do ciclo mostrava Buddy e seu(s) universo(s) como seres reais num simulacro, e eu também vejo nossa vida real assim. Então, quando o final e seu epílogo me socaram a cara com violência, me fazendo chorar feito um menininho de 10 anos no corpo de um obeso adulto chapado, consegui perceber as semelhanças entre os personagens da ficção e nós, supostamente “reais”. Ainda hoje não consigo reler o final sem ficar com os olhos marejados.

    Digam o que disserem. Que era uma série em formatinho. Que o desenho era caído. Que as cores eram básicas. Que tem muito mais diálogos que ação. Que o shortinho jeans da Delphin devia estar todo estragado de tanto ficar na água salgada. Eu não me importo. Pra mim, essa série tem o mesmo peso que Watchmen, que MAUS, que Morte, o Grande Momento da Vida, que Planetary, que o Incal, embora ao mesmo tempo reconheça ser melhor que a primeira citada, pois não fez (assim como as outras comparadas) a porra da indústria forçar todos os quadrinhos a tentarem seguir a mesma premissa, e portanto deixando o mundo das HQs mais triste e sem graça.

    Abração e muito obrigado. E um dia ainda temos que gravar um cast sobre isso. Será mais breve do que imagina.

  1. 28 agosto, 2023

    […] raposinha é especialmente […]

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